SpaceX lança primeiros satélites da constelação Transport Layer da SDA

A Space Exploration Technologies Corp. (SpaceX) colocou em órbita os dez primeiros satélites da constelação experimental militar Transport Layer com o lançamento da missão SDA Tranche 0 Flight 1, a 2 de Abril de 2023.

O lançamento teve lugar às 1429UTC a partir do Complexo de Lançamento SLC-4E da Base das Forças Espaciais de Vandenberg, Califórnia, e foi realizado pelo foguetão Falcon 9-215 (B1075.2) cujo primeiro estágio foi recuperado na plataforma de aterragem LZ-4, em Vandenberg.

Os dez satélites colocados em órbita são designados T0TL A-Cl. 1 (Checkmate-1 ?) a T0TL A-Cl. 5 (Checkmate-5 ?), T0TL B-Cl. 1 (Checkmate-6 ?) a T0TL B-Cl. 3 (Checkmate-8 ?), T0TR-1 (BB-1) e T0TR-2 (BB-2).

A constelação Transport Layer e Tracking Layer

A constelação Transport Layer foi desenvolvida pela SDA (Space Development Agency), e irá servir como espinha dorsal para a NDSA (National Defense Space Architecture), ligando vários satélites em rede e com os combatentes no solo. A Transport Layer irá fornecer a componente chave da rede espacial ao Joint All-Domain Command and Control do Departamento de Defesa dos Estados Unidos.

O primeiro conjunto de 20 satélites irá constituir o que o Pentágono denomina como “Tranche 0” da constelação Transport Layer da SDA, uma rede de satélites a operar na órbita terrestre baixa e que será capaz de ligar os sensores espaciais ao conbatentes no solo.

A agência estebeleceu seis objectivos para a Tranche 0: demonstrar a transmissão de dados de baixa latência para os combatentes pela rede de malha de link cruzado óptico; demonstrar a capacidade de fornecer dados de um sensor espacial para os combatentes por meio da Transport Layer; demonstrar a gestão de batalha limitada da funcionalidade C2; transferência de dados do Integrated Broadcast System através da malha de rede para os conbatentes no solo; armazenar, retransmitir e transmitir dados do Link-16 pela rede quase em tempo real; e operar uma assinatura de tempo independente das referências de GPS para o Observatório Naval dos EUA.

A SDA adquiriu dois tipos de satélites para a Tranche 0, com uma diferença principal sendo que um conjunto de satélites terá links intersatélites ópticos suficientes para se comunicar com outros satélites operando em órbitas terrestres baixas e satélites em órbita terrestre média ou órbita geossíncrona, enquanto o outro irá somente comunicar com outros satélites em órbitas terrestres baixas.

Cada empresa construiu dois tipos diferentes de satélites: classe A e classe B. A Lockheed Martin e a York Space Systems construiram, cada uma, sete sistemas de classe A e três de classe B. Os satélites de classe A têm pelo menos quatro cross-links ópticos, ou seja, eles podem comunicar com satélites que estão no plano um do outro enquanto viajam e também podem comunicar com satélites que estão em planos cruzados ou em órbitas completamente diferentes. Assim, os satélites podem manter essas quatro linhas de comunicação simultaneamente. Os satélites de classe B ligam-se diretamente aos combatentes por meio do sistema de comunicações militares Link-16. Possuem dois cross-links ópticos cada um, o que lhes permite manter uma comunicação constante com os outros satélites de transporte no plano. Os outros dois nós serão transmissores Link-16. O Link-16 é um sistema de comunicação táctica existente usado nos serviços principalmente para sistemas aéreos e terrestres para compartilhar dados de baixa latência.

Após a Tranche 0, a SDA planeja actualizar continuamente e adicionar satélites à sua constelação em órbita em ciclos de dois anos, com a Tranche 1 a ficar online no FY2024, e a Tranche 2 complementando o sistema no FY2026.

A Tracking Layer é uma constelação experimental de satélites militares desenvolvida pela SDA, que fornecerá indicações globais, alertas, rastreamento e direccionamento de ameaças avançadas de mísseis, incluindo sistemas de mísseis hipersónicos.

A SDA procedeu à concessão de dois contratos para a primeira geração da Tracking Layer. Esses contratos representam passos importantes para o desenvolvimento da tranche inaugural da NDSA (chamada Tranche 0). Uma vez totalmente operacional, a camada de rastreamento SDA será constituída por uma constelação heterogénea proliferada de veículos espaciais (SVs) de amplo campo de visão (WFOV) que fornecem cobertura global persistente e capacidade de custódia combinada com o Missile Defense Agency (MDA) Hypersonic and Ballistic Tracking Space Sensor (HBTSS) Medium Field of View (MFOV) SVs, que fornecem capacidade de acesso global de precisão. O conjunto inicial de concessões de contratos iniciou o desenvolvimento dos primeiros oito SVs WFOV proliferados de baixo custo. A capacidade demonstrada pela Tracking Layer Tranche 0 fornecerá alerta de mísseis e informações de rastreamento para as autoridades de defesa nacional, além de dados de rastreamento e sinalização para elementos de defesa antimísseis.

A Tracking Layer da SDA explora áreas técnicas, incluindo, entre outras: arquiteturas integradas e híbridas, incluindo recursos de alerta de mísseis/defesa de mísseis existentes e planejados (MW/MD); reduções significativas em tamanho, peso, potência e custo (SWaP-C) e/ou melhorias significativas de desempenho em hardware, software, algoritmos, subsistemas, conceitos ou projetos de componentes MW/MD tradicionais; identificação e exploração de novos conceitos ou design de detecção de MW/MD; e habilitação de disciplinas e tecnologias, como engenharia de sistemas, segurança de programas, segurança cibernética, logística ou missão e garantia de qualidade.

Cada satélite terá um sensor infravermelho persistente (OPIR) de “campo de visão amplo” capaz de detectar e rastrear ameaças avançadas de mísseis da órbita terrestre baixa. Os satélites também serão equipados com crosslinks ópticos para passar dados para os satélites de retransmissão da Transport Layer.

Em Outubro de 2020, a SDA concedeu contratos à SpaceX e L3Harris para cada quatro satélites da Tranche 0. O satélite de rastreamento de mísseis da SpaceX é baseado na sua plataforma Starlink com um sensor OPIR adquirido de outro fornecedor.

Lançamento

A cerca de dez horas do lançamento procede-se à activação eléctrica do foguetão Falcon-9. Tanto o lançador como a sua carga são submetidos a uma série de verificações testes antes do início do abastecimento do querosene RP-1. O Director de Voo consulta os controladores a T-38m, determinando assim se tudo está pronto para o início do abastecimento do lançador. O processo de abastecimento de RP-1 inicia-se a T-35m no primeiro estagio, seguindo-se o início do abastecimento do oxigénio líquido (LOX) na mesma altura. O abastecimento de LOX ao segundo estagio inicia-se a T-16m.

A fase terminal da contagem decrescente inicia-se com os motores a serem condicionados termicamente para o lançamento a T-7m. A T-1m é enviado um comando para o computador de voo para iniciar as verificações pré-lançamento e o sistema de supressão sónica é activado na plataforma de lançamento que é inundada por milhões de litros de água. Por esta altura os tanques de propelente também são pressurizados. A T-45s o Director de Lançamento da SpaceX verifica se todos os parâmetros estão prontos para a missão, sendo também verificado que o espaço aéreo está pronto para o lançamento. A sequência de ignição é iniciada a T-3s. A T=0s o foguetão abandona a plataforma.

Abandonando a plataforma de lançamento, o Falcon-9 inicia uma série de manobras para se colocar na trajectória de voo correcta. A fase MaxQ, de máxima pressão dinâmica, é atingida a T+1m 12s, sendo nesta altura que o lançador atinge o ponto mais elevado de ‘stress’ mecânico na sua estrutura.

O final da queima do primeiro estágio (MECO – Main Engine Cut-Off) ocorre a T+2m 17s, dando-se três segundos depois a separação entre o primeiro e o segundo estágio, com este a entrar em ignição a T+2m 28s.

A manobra de regresso do primeiro estágio ocorre entre T+2m 33s e T+3m 28s. Entretanto, a ejecção das duas metades da carenagem de protecção ocorre a T+3m es. A queima de reentrada do primeiro estágio ocorre entre T+6m 9s e T+6m 25s, enquanto a queima de aterragem ocorre entre T+7m 15s e T+7m 48s, sendo recuperado com sucesso.

Devido à natureza militar da missão, a SpaceX não divulgou os tempos relativos ao final da queima do segundo estágio e posteriores manobras, bem como relativos à separação dos satélites. 

O foguetão Falcon-9

Baptizado em nome da nave Millenium Falcon da saga cinematográfica “Guerra das Estrelas”, o foguetão Falcon-9 v1.1 é um lançador a dois estágios projectado e fabricado pela SpaceX para o transporte seguro e fiável de satélites e do veículo Dragon para a órbita terrestre. Sendo o primeiro foguetão completamente desenvolvido no Século XXI, este lançador foi projectado desde o início para ter a máxima fiabilidade. A sua simples configuração de dois estágios minimiza o número de eventos de separação (staging) e com nove motores no primeiro estágio, pode completar a sua missão em segurança mesmo na possibilidade de perda de um motor.

O Falcon-9 fez história em 2012 quando colocou a cápsula Dragon na órbita correcta para uma manobra de encontro com a estação espacial internacional, fazendo da SpaceX a primeira companhia comercial a visitar a ISS. Desde então, a SpaceX realizou múltiplas missões para a ISS transportando e recolhendo carga para a NASA. O Falcon-9, bem como a cápsula Dragon, foram desenhados na base do desenvolvimento de um sistema de transporte de astronautas para o espaço e num acordo com a NASA, a SpaceX está activamente a trabalhar para atingir esse objectivo.

O foguetão Falcon-9 Upgrade, ou Falcon-9 FT, (a seguir designado simplesmente como ‘Falcon-9’) representa a mais recente evolução deste lançador. De forma geral o Falcon-9 tem 68,4 metros de comprimento, 3,7 metros de diâmetro e uma massa de 541.300 kg. O veículo é capaz de colocar uma carga de 13.150 kg numa órbita terrestre baixa ou 4.850 kg numa órbita de transferência geossíncrona.

O primeiro estágio do Falcon-9 está equipado com nove motores Merlin (Merlin-1D) e tanque de liga de alumínio e lítio que contêm oxigénio líquido e querosene RP-1. Após a ignição, um sistema de segurança fixa o veículo na plataforma de lançamento e garante que todos os motores são verificados como estando na força máxima antes de libertar o foguetão para o seu voo. Então, com uma força superior a cinco aviões Boeing 747 em potência máxima, os motores Merlin lançam o foguetão para o espaço. Ao contrário dos aviões, a força de um foguetão vai aumentando com a altitude – o Falcon-9 gera 6.806 kN ao nível do mar mas atinge 7.426 kN no vácuo espacial. Os motores do primeiro estágio vão sendo aumentados em potência perto do final da queima do estágio para assim limitar a aceleração do veículo à medida que a massa do lançador vai diminuindo com a queima do combustível. O tempo total de queima do primeiro estágio é de 162 segundos.

Com os seus nove motores agrupados juntos na configuração ‘octaweb’, o Falcon-9 pode aguentar a falha de até dois motores durante o lançamento e mesmo assim conseguir atingir a órbita terrestre com sucesso. O Falcon-9 é o único lançador na sua classe com esta característica chave.

O motor Merlin foi desenvolvido internamente pela SpaceX mas vai encontrar as suas raízes aos motores das missões Apollo, nomeadamente o sistema de injecção baseado no motor do módulo lunar. O propolente é alimentado através de uma única conduta, com uma turbo-bomba de dupla pá que opera num ciclo de gerador a gás. A turbo-bomba também fornece o querosene a alta pressão para os actuadores hidráulicos, que depois recicla para a entrada a baixa pressão. Isto elimina a necessidade de um sistema hidráulico separado e significa que não é possível ocorrer uma falha no controlo de vector de força por falta de fluido hidráulico. Uma terceira utilização da turbo-bomba é o fornecimento de controlo de rotação ao actuar no escape da turbina de exaustão (no segundo estágio). Combinando-se estas características num só dispositivo aumenta-se assim de forma significativa o nível de fiabilidade do sistema.

O motor é capaz de desenvolver uma força de 654 kN ao nível do mar, 716 kN no vácuo, com um impulso específico de 282 segundos (nível do mar) e 311 segundos (vácuo).

A secção interestágio é uma estrutura compósita que liga o primeiro e o segundo estágio e alberga os sistemas de libertação e separação. O Falcon-9 utiliza um sistema de separação totalmente pneumático para uma separação de baixo impacto e altamente fiável que pode ser testado no solo, ao contrário dos sistemas pirotécnicos utilizados na maior parte dos lançadores.

O segundo estágio é propulsionado por um único motor Merlin de vácuo e coloca a carga a transportar na órbita desejada. O motor do segundo estágio entra em ignição poucos segundos após a separação entre o segundo e o primeiro estágio, e pode ser reiniciado várias vezes para colocar múltiplas cargas em diferentes órbitas. Para máxima fiabilidade, o segundo estágio está equipado com sistemas de ignição redundantes. Tal como o primeiro estágio, o segundo estágio é feito a partir de uma liga de alumínio e lítio.

O motor Merlin de vácuo (Merlin-1D de vácuo) desenvolve uma força de 934 kN e o seu tempo de queima é de 397 segundos.

A carenagem compósita é utilizada para proteger a carga durante a passagem do Falcon-9 pelas camadas mais densas da atmosfera. Quando a missão do Falcon-9 é o lançamento do veículo de carga Dragon, a carenagem não é utilizada pois a cápsula possui o seu próprio sistema de protecção.

A carenagem tem 13,1 metros de comprimento e 5,2 metros de diâmetro. Fabricada em fibra de carbono, separa-se em duas metades utilizando um sistema de separação de actuadores pneumáticos semelhantes aos que são utilizados para a separação entre o primeiro e o segundo estágio.

A sequência de lançamento para o Falcon-9 é um processo de precisão ditada pela janela de lançamento tendo em conta a posição orbital a ser ocupada pela carga a bordo. Se a janela de lançamento é perdida, a missão é então adiada para a próxima janela de lançamento disponível.

Cerca de quatro horas antes do lançamento, inicia-se o processo de abastecimento – primeiro oxigénio líquido seguindo-se o querosene altamente refinado (RP-1). O vapor que se observa a sair do lançador durante a contagem decrescente é na realidade oxigénio a ser libertado dos tanques, sendo esta a razão pela qual o abastecimento de oxigénio líquido se mantém até quase ao final da contagem decrescente.

Lançamento Veículo 1.º estágio Local Lançamento Data Hora (UTC) Carga Recuperação
2023-026 206 B1076.3 CCSFS, SLC-40 27/Fev/23 23:13:50 Starlink G6-1 ASOG
2023-027 207 B1078.1 KSC, LC-39A 02/Mar/23 05:34:14 Endeavour Crew-6 JRTI
2023-028 208 B1061.12 VSFB, SLC-4E 03/Mar/23 18:38:50 Starlink G2-7 OCISLY
2023-029 209 B1062.13 CCSFS, SLC-40 09/Mar/23 19:13:28 OneWeb-L17 LZ-1
2023-033 210 B1073.7 KSC, LC-39A 15/Mar/23 00:30:42 Dragon SpX-27 JRTI
2023-037 211 B1071.8 VSFB, SLC-4E 17/Mar/23 19:26:40 Starlink G2-8 OCISLY
2023-038 212 B1069.6 CCSFS, SLC-40 17/Mar/23 23:38 SES-18 SES-19 JRTI
2023-042 213 B1067.10 CCSFS, SLC-40 24/Mar/23 15:43:10 Starlink G5-5 ASOG
2023-046 214 B1077.4 CCSFS, SLC-40 29/Mar/23 20:01:00 Starlink G5-10 JRTI
2023-050 215 B1075.2 VSFB, SLC-4E 02/Abr/23 14:29 SDA Tranche 0 Flight 1 LZ-4